Mesma rota, crime diferente: Milhões de cigarros são apreendidos por ano em MS e seguem linha da droga
O número de apreensões de maços de cigarro tem aumentado nos últimos anos em Mato Grosso do Sul, se equiparando como é executado o crime de tráfico de drogas. Mas a legislação é diferente, já que o crime é considerado contrabando, com penas menores, como de 2 a 5 anos de reclusão e multa.
Entretanto, a multa muitas vezes não passa de R$ 2 por maço de cigarro. O tenente-coronel Wilmar Fernandes, diretor do DOF (Departamento de Operações de Fronteira) em MS, explicou sobre a rota usada pelos contrabandistas ser a mesma para o tráfico de drogas.
“As rotas utilizadas, tanto pelos contrabandistas quanto pelos traficantes, são as mais diversas, devido à extensa linha de fronteira, onde boa parte desta é seca, o que facilita a ação desses criminosos. A maioria dos cigarros contrabandeados, apreendidos pelo DOF, teve como saída o Paraguai. Assim como a droga, o destino desses ilícitos são os grandes centros populacionais, principalmente os estados localizados na região Sudeste”, explicou.
O tenente-coronel lembrou ainda que ambas estradas, estaduais, federais e vicinais, são utilizadas para o crime. Isso tudo falando somente dos maços de cigarro, sem contar os cigarros eletrônicos que, além de todos os mesmos riscos e prejuízos, ainda causam prejuízo ambiental.
Contravenção
O contrabando entra na lei de Contravenções Penais e pelo Código Tributário Nacional, mas existe também a Lei 11.705/08, que dispõe sobre o tabaco e seus derivados. Estabelece diretrizes para o controle e regulamenta a obrigatoriedade de advertências gráficas sobre os malefícios causados pelo fumo nas embalagens de cigarros e outros produtos derivados do tabaco.
Parecido com o crime de tráfico de drogas, os contrabandistas também utilizam a mesma rota para buscar maços de cigarros. Em sua maioria, são trazidos do Paraguai com destinos diversos, especialmente grandes centros e a região sudeste do país, segundo o tenente-coronel Wilmar Fernandes, diretor do DOF (Departamento de Operações de Fronteira) em MS.

Dados
Só o DOF apreendeu no ano passado 680 mil pacotes de cigarro contrabandeados do Paraguai. Em 2023, foram retirados de circulação 416 mil pacotes, um aumento de 60% nas apreensões.
“Este crescimento está relacionado aos investimentos que o DOF tem feito em equipamentos, tecnologia, inteligência e capacitação de seus policiais para o enfrentamento aos crimes transfronteiriços”, afirmou o diretor do DOF.
Já a PRF (Polícia Rodoviária Federal) apreendeu em 6,7 milhões de maços de cigarro em 2023, enquanto em 2024 foram 6,4 milhões. Já este ano, até os 10 primeiros dias do mês de março, foram 802 mil maços de cigarros retirados nas rodovias federais de Mato Grosso do Sul.
A Polícia e a Receita Federal são as principais autoridades encarregadas de combater o contrabando de cigarros no Brasil.
A carga apreendida pela Polícia Federal corresponde a 1.130.895 maços de cigarro em 2023. No ano seguinte, reduziu para 1.043.778. Já este ano, até o momento, foram 23.467. A Polícia Federal apresentou ainda as cinco cidades com as maiores apreensões do Estado. A maioria em região de fronteira, sendo a maior apreensão em Naviraí, seguida de Campo Grande, Dourados, Três Lagoas e Ponta Porã.
A Receita Federal, que é o órgão responsável pela destruição dos cigarros apreendidos, também apresentou dados da apreensão nos últimos dois anos. Ainda conforme a informação do órgão, o valor do maço varia em cerca de R$ 5,10.
Foram 27.090.606 maços em 2023 e 20.044.544 em 2024. Já este ano foram 4.224.318 maços apreendidos.
Em 2024, a maior apreensão feita pela Receita Federal aconteceu em Mundo Novo, também fronteira com o Paraguai e o Estado do Paraná.
No dia 18 deste mês, a PRF apreendeu 15 mil maços de cigarros em Campo Grande, durante fiscalização na BR-060, quando abordaram um Chevrolet/Corsa. Os policiais notaram que um lençol preto encobria algo que era transportado no veículo. Ao retirar o pano, a equipe descobriu que o motorista transportava cigarros de origem estrangeira.
O autor confessou que pegou a mercadoria em Ponta Porã e levaria para Campo Grande. Ele não possuía CNH, foi preso e entregue à Polícia Judiciária local.

Saúde pública
Conforme artigo publicado no portal Jusbrasil, o contrabando ainda traz consequências negativas para a saúde pública, já que não passam pelo mesmo processo de fiscalização e controle de qualidade dos produtos comerciais, o que pode resultar em cigarros com níveis mais elevados de substâncias tóxicas, como a nicotina, monóxido de carbono e alcatrão.
“Os cigarros contrabandeados costumam ser vendidos a preços mais baixos, o que pode atrair jovens e outros grupos de risco. Isso aumenta o risco de doenças relacionadas ao tabagismo, como câncer, doenças cardíacas e doenças pulmonares”.
Além da saúde e da economia, o diretor do DOF lembrou sobre a questão do aumento de outras violências.
“Somente nos dois últimos anos o DOF recuperou 31 veículos roubados que estavam em posse dos contrabandistas e eram utilizados para o transporte de cigarros. Além do risco já causado as pessoas, na subtração desses automóveis, muitas vezes mediante o emprego de força e armas, boa parte dos criminosos, que segue nesses veículos carregados, não obedece às ordens nos bloqueios policiais e coloca em risco a vida dos agentes que estão nesta fiscalização, assim como das demais pessoas que utilizam a via, pois na tentativa de fugir das forças de segurança, realiza manobras perigosas com esses veículos, força ultrapassagens e trafega em altíssima velocidade em automóveis em situações precárias”, esclareceu.
Máfia dos Cigarreiros
O contrabando de cigarros é lucrativo para criminosos e até envolveu a participação de policiais no crime em Mato Grosso do Sul.
Em junho de 2021, dois policiais militares, um já excluído do quadro de inativos da PMMS, foram denunciados e se tornaram réus pela Operação Nepsis, que já condenou outros 22 criminosos.
No dia 11 de junho daquele ano, o sargento José Roberto dos Santos e o ex-cabo da PMMS Joacir Ratier de Souza foram denunciados pelo MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul). A acusação relembra a investigação da Polícia Federal, que resultou na Operação Nepsis, após descoberta da organização criminosa que contrabandeava cigarros do Paraguai.
A rede criminosa era comandada por Ângelo Guimarães Ballerini, Carlos Alexandre Gouveia, Valdenir Pereira dos Santos e Fabio Costa, o Pingo, também ex-PM. Eles eram responsáveis por organizarem corredores logísticos de passagem dos veículos que transportavam os cigarros contrabandeados até outros estados.
José Roberto e Joacir faziam o serviço de ‘garantidores-pagadores’, agindo em Nova Andradina e Dourados, respectivamente. Eles recebiam um valor mensal da quadrilha e atuavam para garantir o ‘sucesso’ de todas as cargas contrabandeadas que passavam pelas cidades.
Ao término das investigações, o juízo federal declinou da competência para julgar os crimes imputados aos policiais, em favor da Justiça Militar Estadual.

Operação Nepsis
A Nepsis teve início quando a corregedoria da PRF (Polícia Rodoviária Federal) constatou que alguns policiais estavam envolvidos com o contrabando de cigarros. Foi solicitado apoio à Polícia Federal para que fossem atingidos também os demais integrantes da organização criminosa que não fazem parte da instituição. Entre eles, descobriu-se a atuação também de policiais civis e militares.
A Polícia Federal deflagrou em 22 de setembro de 2018 a operação em Mato Grosso do Sul, São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro e Alagoas.
Só em 2017, acredita-se que os envolvidos tenham sido responsáveis pelo encaminhamento de ao menos 1.200 carretas carregadas com cigarros contrabandeados às regiões Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste. Os valores em mercadorias contrabandeadas atingem cifras superiores a R$ 1,5 bilhão.
Foram apreendidos grande quantidade em dinheiro em resort, casas, carros e embarcações de luxo, além de armamento pesado e cargas de cigarros contrabandeados.