Generais demitidos por Bolsonaro descartam risco de golpe
Por Rafael Moraes Moura e Malu Gaspar
A escalada dos últimos dias na tensão entre o Palácio do Planalto, as Forças Armadas e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) reacendeu em Brasília a discussão sobre os riscos de um golpe, em caso de uma eventual derrota do presidente Jair Bolsonaro nas eleições de outubro.
Mas se depender dos ânimos da caserna, o golpe não virá. Essa é a opinião de três generais que ocuparam postos estratégicos durante o governo Bolsonaro, mas acabaram demitidos pelo chefe do Executivo por motivos diversos.
Os três foram unânimes em rechaçar qualquer risco de ruptura institucional em um cenário de derrota de Bolsonaro para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Hoje, esse é o cenário mais provável no segundo turno, de acordo com pesquisas de intenção de voto.
A equipe da coluna apurou ainda que integrantes do Alto Comando também vêm procurando (com discrição máxima) interlocutores no Judiciário e no meio político para passar um recado parecido: o de que, em caso de derrota, Bolsonaro não teria apoio para virar a mesa e anular as eleições.
Parte dessa movimentação visa acalmar integrantes do TSE que temem uma eventual invasão do Congresso e até mesmo das dependências do tribunal, caso Bolsonaro se recuse a aceitar um revés nas urnas.
Magistrados estão preocupados com a repetição, por aqui, das cenas ocorridas nos Estados Unidos no ano passado após a derrota de Donald Trump para Joe Biden. Trump insuflou extremistas a invadirem as dependências do Capitólio, em um ato de vandalismo que chocou o mundo e resultou na morte de cinco pessoas.
“Os comandantes são profissionais experientes, operacionais e não colocariam o prestígio das instituições militares, a cultura militar de respeito à legislação, suas carreiras e suas vidas em apoio a aventuras pessoais”, disse o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, que deixou a Secretaria de Governo em junho de 2019, após entrar na mira do escritor Olavo de Carvalho e do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ).
Dos três ouvidos, ele é o único que concordou em ser citado nominalmente.
Um segundo general, que entrou no rol de demitidos por não ceder a pressões do presidente por ações com propósito eleitoral, repetiu à equipe da coluna a mesma avaliação, na semana passada. “Chance zero, seria cometer um erro velho”, garantiu.
Já outro general que deixou o governo e tem interlocução com ministros de cortes superiores vem repetindo a eles que descarta as chances de ruptura institucional. “Minha geração pagou um preço muito alto por conta da ditadura militar. Não queremos assumir mais um fardo”, comparou.
O último capítulo da crise entre Bolsonaro e o TSE começou quando o general Heber Portella, representante militar no comitê de transparência das eleições formado pela corte, enviou ao tribunal uma série de questionamentos colocando em dúvida a segurança do sistema e sugerindo que ele é vulnerável a fraudes.
A atitude deu munição ao presidente para lançar suspeitas e fazer afirmações falsas sobre como funciona o sistema de apuração dos votos, mencionando uma suposta “sala secreta” que nunca existiu.
Para tentar conter a crise, foram feitas reuniões entre o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, o ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Oliveira, e os presidentes do Supremo, Luiz Fux, e o do TSE, Edson Fachin.
Em outra frente, o ministro da Defesa ainda tomou para si a interlocução direta com o TSE, desautorizando os questionamentos e as suspeitas lançadas por Portella.
Ainda assim, não é possível dizer ainda que a situação se acalmou na capital federal – daí a movimentação dos generais em relação aos principais atores institucionais de Brasília.
Na quinta-feira, em um duro recado para o governo, o presidente do TSE, Edson Fachin, afirmou que “forças desarmadas” são responsáveis pelas eleições e que “ninguém nem nada vai interferir” no pleito.
No dia seguinte, Bolsonaro disse que quer “eleições limpas, transparentes, com voto auditável”. Afirmou, ainda, que as Forças Armadas foram convidadas a participar do processo eleitoral — e não para “servir de moldura para quem quer que seja”.
Enquanto o presidente não mostrar qualquer intenção de baixar as armas, todas as atenções estarão voltadas para as respostas dos militares.